O secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP), Samuel Kinoshita, parece ter descoberto uma nova modalidade de gestão pública: o home office internacional. Depois de posar sorridente diante da Casa Branca, em Washington, no mês passado, agora ele desembarca em Orlando, na Flórida, para participar de um evento global de tecnologia — o Gartner IT Symposium/Xpo™.
A conferência, que discute o papel dos líderes de TI como “agentes de transformação em tempos de incerteza”, virou a mais nova vitrine do secretário que, ao que tudo indica, prefere administrar a Sefaz-SP a milhares de quilômetros de distância.
A viagem é oficial, claro. E, como manda o figurino, Kinoshita levou na bagagem alguns funcionários da Fazenda paulista. Afinal, o dinheiro público é generoso com passagens, diárias e hotéis quando o destino é um resort em Orlando.
O curioso é que, em menos de um mês, o secretário repete o roteiro internacional — novamente para os Estados Unidos — enquanto a Secretaria da Fazenda mergulha em um dos maiores escândalos de corrupção e extorsão de sua história.
Enquanto auditores fiscais são acusados de arrancar fortunas de empresas como Ultrafarma e Fast Shop, em esquema bilionário de extorsão – exigindo dos empresários mais de R$ 1 bilhão – Kinoshita parece mais empenhado em garantir boas fotos de suas viagens turísticas do que em dar respostas para os desmandos de seus funcionários.
Extorsão de auditores fiscais da Sefaz-SP contra os executivos da Ultrafarma e FastShop
Em Washington, Kinoshita registrou-se sorridente com a Casa Branca ao fundo, dizendo estar ali para “abrir portas para investimentos e parcerias” e “divulgar a liderança consistente” do governador Tarcísio de Freitas. A mesma liderança que, aparentemente, se traduz em silêncio diante de um sistema de chantagem dentro da própria secretaria.
O hábito das viagens, aliás, já se tornou marca registrada da gestão. Tarcísio de Freitas. Marcelo Bergamasco, o fiel escudeiro de Kinoshita, transformou Milão, na Itália, em um anexo da Sefaz-SP. Uma funcionária da pasta preferiu Lisboa, em Portugal, para experimentar o teletrabalho — até esquecer o laptop no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. Agora é Washington que figura como a filial mais chique da “Sefaz pelo Mundo”.
O contribuinte paulista, no entanto, segue sem entender quais portas mágicas foram abertas na capital americana ou que investimentos floresceram desse turismo institucional dos executivos do governo do Estado de São Paulo.
A verdade é que a Secretaria da Fazenda de São Paulo parece menos preocupada em recuperar a credibilidade abalada do que em colecionar carimbos no passaporte. A cada nova denúncia de corrupção, a resposta é uma viagem. A cada escândalo de sonegação bilionária, mais uma selfie no exterior. Enquanto isso, o governador Tarcísio de Freitas observa em silêncio absoluto.
O caso dos auditores fiscais, que arrancavam dinheiro de empresas sob ameaça de autuações, deveria ter provocado uma devassa completa na Sefaz-SP. Mas, até agora, apenas dois servidores foram oficialmente responsabilizados, como se o esquema tivesse nascido e morrido em um canto obscuro da burocracia na avenida Rangel Pestana.
O restante segue convenientemente intocado. E Kinoshita, em vez de explicar o sumiço de recursos e o avanço da sonegação de ICMS, prefere discutir “inteligência artificial” com os fornecedores da própria secretaria — como a empresa Gartner, cuja influência dentro da Fazenda só cresceu nos últimos dois anos.
A presença da Sefaz-SP no evento de Orlando, portanto, não é apenas simbólica — é um retrato. Um retrato de uma gestão que confunde inovação com ausência, modernidade com fuga, e transparência com marketing. O Brasil, segundo o programa oficial, marca presença no simpósio pelo 20º ano consecutivo. Mas, no entanto, é a primeira vez que a Fazenda paulista se apresenta em meio a um turbilhão ético e administrativo.
Enquanto Trump ameaça o Brasil com novas tarifas e empresários paulistas convivem com a insegurança tributária, o secretário da Fazenda prefere fazer turismo tecnológico. E o governador Tarcísio de Freitas parece satisfeito em comandar uma administração em que os servidores trabalham de Milão, Lisboa, Washington e agora Orlando.
A “gestão itinerante” da Fazenda paulista talvez seja o retrato mais fiel do governo Tarcísio: uma administração que viaja, posa, discursa sobre inovação — mas foge da realidade.


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