Dois oportunistas surfando no sangue derramado no Rio

Luciano Huck (Globo) e Luiz Bacci (SBT) transformam a tragédia do Complexo do Alemão e da Penha em palco de oportunismo televisivo — e em combustível para engajamento nas redes sociais

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O Brasil ligou o modo automático da barbárie. Cento e vinte e uma pessoas foram mortas na megaoperação do Complexo do Alemão e da Penha. Um massacre. Uma cena que, em qualquer país minimamente civilizado, impediria qualquer apresentador de terminar o programa olhando para uma câmera com naturalidade. Aqui não. Aqui vira oportunidade narrativa, disputa de narrativa, moeda emocional — e instrumento de autopromoção demagógica.

Luciano Huck, o eterno aspirante a estadista da Globo, percebeu que a tragédia lhe oferecia a chance perfeita de performar sensatez humanista: o discurso lacrado, higienizado, impecável, calibrado para o viral. Uma fala milimetricamente “moderada”, onde ele condena o modelo fracassado de segurança pública, mas sem jamais tocar nas estruturas reais que a própria Globo historicamente legitimou durante décadas no jornalismo policialesco do Rio. 

Huck enuncia a dor do Rio como quem lê teleprompter — não como quem sangra. É humanismo pasteurizado para classe média da Zona Sul aplaudir de pé e repostar. É o Twitter ou o X, o Instagram, o Facebook, o Threads ou até o TiTok orientado o manifesto/postagem de Huck. E a TV Globo bate palma para o seu maior exemplo de apresentador/oportunista.

Do outro lado da câmera, Luiz Bacci, que há anos ergue audiência surfando cadáveres televisivos na Record e que agora faz o mesmo no SBT, enxergou na fala de Huck a chance perfeita de inverter o vetor moral e transformar o oportunismo humanista do colega numa enorme brecha de autopromoção punitivista. 

Ele acusa Huck de “romantizar o crime” — como se o próprio Bacci não vivesse em looping narrativo explorando violência urbana como commodity midiática diária. A crítica de Bacci é um espelho invertido: “o meu oportunismo é legítimo, o do outro é inadmissível”.

Huck oportuniza a tragédia para se fantasiar de articulador político sensato. Bacci oportuniza a tragédia para inflamar a lógica da guerra como entretenimento. Oportunistas e insensatos. Infames. Os dois.

E o Rio segue contabilizando mortos que não cabem nos dois discursos — nem no do palco iluminado da TV Globo, no Jardim Botânico, nem no telejornal forjado SBT, na Via Anhanguera. Mas o oportunismo é o mesmo nos dois endereços. Só a embalagem estética e a plástica é diferente.

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