Governo Tarcísio: quando tudo em São Paulo vira PCC

Pergunta ao governador Tarcísio de Freitas e ao secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo, Guilherme Derrite: PCC acima de tudo e insegurança pra cima de todos?

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A deflagração da Operação Spare nesta quinta-feira (25/9) trouxe de volta uma cena cada vez mais comum em São Paulo: qualquer irregularidade empresarial, por menor que seja, rapidamente ganha o selo de ligação com o Primeiro Comando da Capital (PCC). Desta vez, o foco foram motéis e empresas hoteleiras supostamente usados para lavagem de dinheiro do crime organizado. Segundo a Receita Federal e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP), a rede movimentou R$ 450 milhões entre 2020 e 2024.

O número impressiona à primeira vista, mas perde força quando se faz a conta. São 48 meses de movimentação, o que resulta em R$ 9,3 milhões por mês. Dividindo entre cerca de 60 motéis, a média mensal cai para R$ 156 mil por estabelecimento. Para quem conhece o setor, trata-se de um faturamento compatível com a realidade de negócios desse tipo. Se isso for “lavagem” exclusiva para o PCC, a facção criminosa, com certeza, estaria em crise financeira.

O personagem central: Flavinho

As investigações apontam como líder do esquema o empresário Flávio Silvério Siqueira, conhecido como Flavinho, identificado há muitos anos, por auditores fiscais, como um contumaz adulterador de combustíveis e de atuar como sonegador em redes de postos de gasolina de 2020 até 2024. Pergunta: Em quatro anos Flavinho adulterou combustíveis e sonegou impostos e os fiscais da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz-SP) nada fizeram? 

O que o mercado sabe da sua ligação com o PCC, no entanto, ainda parece mais social do que criminal. Flavinho cresceu no bairro do Tatuapé e manteve amizade com pessoas que, anos depois, ingressaram na facção. Isso, na prática, não equivale a comprovação de participação em tráfico de drogas ou integração à estrutura da organização criminosa.

Mesmo assim, as operações oficiais insistem em carimbar qualquer negócio suspeito como parte da engrenagem do PCC. É o que se viu também com os 267 postos de combustíveis apontados na mesma investigação. Juntos, movimentaram mais de R$ 4,5 bilhões em quatro anos, mas recolheram apenas R$ 4,5 milhões em tributos – o que configura fraude tributária escancarada. Mas como não há registros de que as viaturas da fiscalização da Sefaz-SP saíram para coibir a sonegação de ICMS, nos últimos dois anos, a impunidade prevaleceu no Estado de São Paulo.

A questão é: estamos diante de um problema de sonegação bilionária ou de mais uma tentativa de enquadrar todos os desvios no rótulo “facção criminosa”? Flavinho pode até ter alguma ligação de bairro com integrantes do PCC, mas será que isso basta para transformá-lo no operador de um esquema milionário de lavagem de dinheiro?

A narrativa que se repete

Não é a primeira vez que essa associação aparece. Em 2024, o governador Tarcísio de Freitas chegou a afirmar que o PCC controlava mais de mil postos de combustíveis, mas não identificou até hoje nenhum deles. Meses depois, o próprio promotor Lincoln Gakiya, referência no tema, afirmou que não havia o PCC no comando de uma grande distribuidora de combustível, mas sim, fraude tributária de grande escala. Um ano mais tarde, o discurso oficial mudou e se voltou a bater na tecla da facção criminosa.

Operação Spare repete esse roteiro. Há indícios claros de crimes fiscais, redes de laranjas e adulteração de combustíveis. Mas a insistência em vincular cada detalhe ao PCC fragiliza a própria investigação. Afinal, se tudo é PCC, nada é.

É evidente que há empresários milionários construindo impérios em cima de fraudes e esquemas ilegais. Também é fato que parte desse dinheiro pode, em algum momento, se cruzar com atividades do crime organizado. Mas transformar qualquer movimentação irregular em prova de domínio da facção gera mais manchete do que resultado.

O risco é claro: empresários que praticam sonegação bilionária podem ser tratados como meros “operadores da facção”, enquanto provas consistentes de fraude tributária ficam em segundo plano? 

A Operação Spare, assim como outras recentes, parece se apoiar mais na força do rótulo do que na solidez das provas. A conta dos motéis mostra isso. O caso de Flavinho mostra isso. E o histórico recente das narrativas oficiais reforça a desconfiança: em São Paulo, tudo pode virar PCC.

Veja outros artigos onde registro que o governador Tarcísio de Freitas – com o apoio do Ministério Público – culpa sempre o PCC de tudo o que acontece em São Paulo:

https://blogdoluchetti.com.br/2025/09/05/do-pcc-aos-fiscais-corruptos-da-sefaz-como-o-mp-paulista-ajuda-a-blindar-o-governador-tarcisio

https://blogdoluchetti.com.br/2025/09/08/carbono-oculto-e-icaro-tarcisio-e-o-mp-pode-ser-uma-sintonia-suspeita

Comentários

  1. Avatar de Gilberto Wachtler
    Gilberto Wachtler

    Perfeito! Pouco ou quase nada se fala do talvez o maior sonegador do Brasil, Carrefour.
    Atenção tb. Ao crescimento desproporcional das acadêmias de ginastica. milhares de alunos matriculados e poucos ativos. Fácil de simular atividade dos alunos e lavagem muito sugestiva para o crime e ou empresas.

    1. Avatar de Alberto Luchetti
      Alberto Luchetti

      Verdade Gilberto. Essas academias precisam ser fiscalizadas também

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