O MPSP em vez de exercer seu papel constitucional de fiscalização, parece empenhado em proteger a imagem do governador Tarcísio de Freitas — mesmo diante de escândalos graves no setor de combustíveis e de denúncias antigas, fartamente documentadas, sobre a atuação de sonegadores bilionários no Estado.
As denúncias sobre sonegação no setor circulam no MPSP desde 2018. Várias delas apontam, com documentação robusta, para a conivência ou negligência de funcionários da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (SEFAZ-SP) e de auditores fiscais. Ainda assim, ao longo dos anos de gestão do então procurador-geral Mário Sarrubbo, nada de efetivo foi feito. E quando a oposição começou a cobrar — já no governo Tarcísio de Freitas, em 2023 — o Ministério Público tampouco reagiu.
A partir de junho de 2023, o Blog do Luchetti passou a publicar semanalmente reportagens detalhando irregularidades e encaminhou essas informações ao Forum de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro do Estado de São Paulo (Focoosp) e ao próprio Ministério Público. A instituição, chefiada à época pelo mesmo Sarrubbo que hoje ocupa a Secretaria Nacional de Segurança Pública, do Ministério da Justiça, jamais deu respostas consistentes.
Em abril de 2024, Tarcísio substituiu Sarrubbo por Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, terceiro colocado da lista tríplice — uma escolha inédita, respaldada nos bastidores pelo próprio Sarrubbo e marcada pelo suposto veto do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, ao primeiro colocado, José Carlos Cosenzo. Ainda assim, tanto Sarrubbo quanto Oliveira e Costa já deveriam conhecer, desde 2018, os nomes e métodos dos grandes sonegadores de combustíveis.
Quando o Blog do Luchetti solicitou um parecer formal sobre as denúncias — incluindo suspeitas de ligação entre uma das maiores empresas investigadas e o Primeiro Comando da Capital (PCC) — a resposta do MPSP, em 21 de maio de 2024, foi curta e objetiva: tratava-se apenas, “em tese”, de crime contra a ordem tributária. E a solução encontrada foi o arquivamento da investigação.
Como, então, explicar que um ano depois o mesmo Ministério Público protagonize, ao lado do governo Tarcísio, as operações Carbono Oculto e Poço Lobato?

Operações espetaculares, omissões convenientes
Na operação Carbono Oculto, chamou atenção a liderança artificial do secretário da Fazenda, Samuel Kinoshita, que apareceu em entrevistas como parte central da investigação — algo absolutamente atípico para um secretário que, teoricamente, deveria ser investigado quando há fraudes bilionárias em seu próprio setor.
Mais estranho ainda: nenhum fiscal da SEFAZ-SP foi investigado, afastado ou preso. O que parece é que para o MPSP, fraudes colossais acontecem sozinhas — sem conivência, sem omissão, sem falhas internas.
O mesmo roteiro se repetiu na operação Poço Lobato: bilhões em prejuízo ao Estado, mas zero responsabilização de auditores fiscais para anos e anos de sonegação e de denuncias dessas práticas divulgadas pela imprensa.
O regime monofásico expõe ainda mais o absurdo
Toda essa complacência fica ainda mais perturbadora quando se olha para o contexto legal. O ICMS dos combustíveis passou ao Regime Monofásico pela Lei Complementar 192/2022, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas sua aplicação prática só começou após as regulamentações do Conselho Nacional de Política fazendária (CONFAZ), já no governo Lula, em 2023.
A regulamentação foi aprovada e assinada pelo secretario da Fazenda, Samuel Kinoshita, e a implantação foi realizada nas seguintes datas:
Diesel e Biodiesel: 1º de maio de 2023
Gasolina e Etanol Anidro: 1º de junho de 2023
GLP/GLGN: maio de 2023
A lei também zerou PIS/Cofins e determinou alíquotas unificadas de ICMS no país, obrigando os estados — inclusive São Paulo — a se adaptar.
Nesse cenário, surgem perguntas inevitáveis:
- Copape (Carbono Oculto) e Refit (Poço Lobato) operavam com regimes especiais no Estado do Amapá que zeravam o ICMS?
- Essas empresas deixavam de pagar tributos de maneira formal, amparadas pela legislação vigente?
- Se o blog denunciou isso sistematicamente por dois anos, por que o MP não agiu anteriormente?
- Por que nenhuma investigação interna, nenhuma sindicância e nenhum afastamento ocorreram na Sefaz-SP?
- E por que — de repente — duas megaoperações simultâneas?
A resposta possível pode ser mais política do que jurídica: o medo de a Polícia Federal assumir o protagonismo, como ocorreu nos casos Ultrafarma e FastShop, que acabaram alcançando fiscais graduados ligados ao subsecretário da Receita Estadual, Marcelo Bergamasco, e que extorquiram bilhões de empresários de São Paulo.
Um Ministério Público seletivo, conveniente — e perigoso
O que se vê é um Ministério Público que age com surpreendente rapidez quando pode blindar o governo Tarcísio, mas com espantosa lentidão quando precisa investigar estruturas internas, fiscais influentes e eventuais falhas da própria administração estadual.
É, no mínimo, lamentável — e profundamente preocupante — assistir ao MPSPfingir combater fraudes que há anos se recusa a enfrentar, enquanto protege silenciosamente o governo Tarcísio e se comporta como um órgão auxiliar do Executivo.


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